A crescente preocupação global com a sustentabilidade e a proteção do meio ambiente transformou a legislação ambiental em uma das mais rigorosas e de maior impacto para o setor empresarial. No Brasil, a Lei nº 9.605/98, a Lei de Crimes Ambientais, estabelece penas para condutas que causam dano ao meio ambiente, podendo responsabilizar criminalmente tanto a pessoa física (o empresário, o gestor) quanto a própria pessoa jurídica (a empresa).
Muitos empresários, focados na produtividade e no lucro, podem subestimar o alcance e a gravidade das sanções penais ambientais, expondo-se a riscos que vão muito além de multas e paralisações.
A Abrangência dos Crimes Ambientais
Os crimes ambientais são diversos e podem ser praticados em diferentes contextos. A lei os organiza por categorias de bens jurídicos tutelados: poluição, crimes contra a fauna, crimes contra a flora, crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural, e crimes contra a administração ambiental.
Elementos Comuns para a Configuração:
- Dano ou Potencial Dano Ambiental: A conduta deve resultar em dano efetivo (ex: poluição de um rio que mata peixes) ou em potencial dano (ex: instalação de indústria sem licença em área sensível).
- Ação ou Omissão: O crime pode ser cometido por uma ação direta (desmatar, despejar resíduos) ou por uma omissão (deixar de implementar sistemas de tratamento de efluentes obrigatórios).
- Nexo Causal: É preciso demonstrar a ligação entre a conduta do empresário/empresa e o dano ambiental.
- Dolo ou Culpa: Embora a lei preveja algumas modalidades culposas, a maior parte dos crimes exige o dolo (intenção) ou, ao menos, a culpa (negligência, imprudência ou imperícia).
Exemplos Mais Comuns Envolvendo Empresários:
- Poluição (Art. 54): Causar poluição de qualquer natureza que resulte ou possa resultar em danos à saúde humana, ou que provoque a morte de animais ou a destruição significativa da flora. Isso inclui descarte irregular de resíduos sólidos, lançamento de efluentes industriais sem tratamento adequado, emissão de gases poluentes acima dos limites.
- Desmatamento Ilegal (Art. 38): Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente ou utilizá-la em desacordo com as normas de proteção, sem autorização.
- Operação sem Licença (Art. 60): Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar empreendimentos ou atividades potencialmente poluidoras sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou em desacordo com a obtida.
- Maus-tratos a Animais (Art. 32): Embora mais associado a indivíduos, empresas do agronegócio ou de entretenimento podem ser responsabilizadas por maus-tratos a animais.
- Extração Mineral Ilegal (Art. 55): Extrair recursos minerais sem a devida autorização legal, ou em desacordo com a obtida.
A Inovadora Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica
Um dos aspectos mais marcantes da Lei de Crimes Ambientais é a previsão expressa da responsabilização penal da pessoa jurídica (Art. 3º). Isso significa que a empresa, como entidade, pode ser processada e condenada criminalmente, independentemente da responsabilização de seus diretores ou funcionários.
Penas para a Pessoa Jurídica:
As penas aplicáveis à pessoa jurídica não incluem privação de liberdade, mas são severas e impactantes:
- Multa: Proporcional ao dano causado e à capacidade econômica da empresa.
- Prestação de Serviços à Comunidade: Obrigação de realizar atividades como reflorestamento, conservação de solo, recuperação de áreas degradadas, manutenção de espaços públicos, etc.
- Interdição Temporária de Direitos: Suspensão parcial ou total das atividades, proibição de contratar com o Poder Público, ou de obter subsídios e incentivos.
- Liquidação Forçada: Em casos extremos, a liquidação da pessoa jurídica.
Consequências para o Empresário Pessoa Física:
Além da empresa, os diretores, administradores, membros de conselho e órgãos técnicos, auditores, gerentes, prepostos ou procuradores com responsabilidade pela conduta criminosa também podem ser responsabilizados criminalmente, com penas de detenção ou reclusão. A responsabilização ocorre por ação (praticar o crime) ou omissão (deixar de agir quando tinha o dever legal de impedir o resultado).
Prevenção e Defesa: O Compliance Ambiental e a Atuação Jurídica
Diante desse cenário de riscos elevados, a prevenção é a estratégia mais inteligente e econômica para o empresário.
- Compliance Ambiental: Implementar e manter um sólido programa de compliance ambiental, que inclua:
- Auditorias regulares: Para identificar e corrigir não conformidades antes que se tornem problemas criminais.
- Obtenção e Renovação de Licenças: Garantir que todas as licenças e autorizações ambientais estejam em dia e que a empresa opere estritamente dentro das condições estabelecidas.
- Treinamento da Equipe: Conscientizar funcionários e gestores sobre as leis ambientais e os procedimentos internos.
- Monitoramento e Controle: Implementar sistemas de monitoramento de efluentes, emissões e resíduos.
- Investimento em Tecnologia: Utilizar tecnologias limpas e processos produtivos mais sustentáveis.
- Atuação do Advogado Criminalista: Em caso de investigação ou processo, a intervenção de um advogado criminalista especializado em crimes ambientais é crucial. Ele poderá:
- Acompanhar Vistorias e Inquéritos: Garantir a legalidade dos procedimentos e a proteção dos direitos do empresário e da empresa.
- Analisar Laudos Periciais: Contestar perícias que não seguiram os padrões técnicos adequados ou que apresentam inconsistências.
- Argumentar Ausência de Dolo/Culpa: Demonstrar que o dano ocorreu por caso fortuito, força maior ou que não houve intenção ou negligência por parte do empresário.
- Buscar Acordos (TAC/ANPP): Negociar Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) com órgãos ambientais ou Acordos de Não Persecução Penal (ANPP) com o Ministério Público para evitar o processo criminal ou atenuar suas consequências, mediante a reparação do dano e o cumprimento de obrigações.
- Defender a Corresponsabilidade: Em situações de corresponsabilidade (cadeia produtiva, terceiros), trabalhar para diluir ou redefinir a culpa.
O passivo ambiental pode ser tão ou mais devastador que o financeiro. A proteção do meio ambiente e a conformidade legal não são apenas obrigações éticas, mas imperativos para a sustentabilidade e a própria existência do negócio. Esteja preparado e bem assessorado.